terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Ciclo I - O Colhedor

Eu sou um simples colhedor de frutas. Caminho longas estradas, e atravesso matas fechadas buscando tesouros em galhos. Minha ambição de vida é encontrar a maçã perfeita. Não perfeita para todos, mas perfeita para mim. Não precisa ser a maçã mais vermelha da árvore, pois consigo me impressionar com o simples que nem eu . Não tem que ser da macieira no topo do Caburaí. Nem precisa estar no topo. Terei medo de ir alto demais, e acabar caindo. Não, a maçã perfeita pode estar naquela árvore que eu nunca reparei nos meus caminhos para casa. Um dia simplesmente noto que ela existe. O seu aroma me chama. Consigo imaginar seu gosto doce como mel ao fechar meus olhos. Ao dar minha primeira mordida, sei que nada será igual.

Encontrei minha maçã, e por ela tenho gula. Colho peras e laranjas para todos os anões e gigantes, e as chupamos juntos enquanto rimos. Mas essa maçã é minha. Não quero dividí-la com ninguém. Mas mesmo assim me pedem fatias. E a maçã brilha, como se quisesse mesmo ser repartida. Seu sabor doce chama os andarilhos, que também querem provar a minha maçã. Com o sangue bombeando egoísmo e ciume, tenho vontade de matá-los. Mas não tenho forças. "Eu sou um simples colhedor de frutas! A única coisa que espero da minha sina é poder ter a minha maçã perfeita, somente para mim." E fujo com ela em mãos.

Escondido, longe dos olhos cobiçadores, cheiro minha maçã. Ela é tão tentadora! Tenho pena de dar a primeira mordida, pois uma vez violada, não manterá seu doce para sempre. Mas eu sucumbo, e cravo meus dentes. E CUSPO! Não era doce como mel, porém amargo como fel. Minha maçã perfeita tinha um gosto horrível. Não conseguirei comê-la nunca. O que resta dela passa de vermelha para preto, enquanto eu sinto uma terrível ansia em mim. Estou sem ar. Minha maçã me envenenou. Pareço sem forças, quase que caindo de joelhos. Mas ainda tenho o suficiente para cuspir fora o pedaço que engoli.

Desmaio, mas logo volto ao mundo. Tudo parece tão claro agora. O que vi na maçã que jaz ao lado do meu corpo? Talvez foi uma doce ilusão. Ou culpa de um encantamento. Como Branca de Neve e o resto do mundo, cai nas garras da inocência. Porém, comer maçãs podres me tornam mais resistente, mesmo que a ingenuidade dê lugar à angustia. Perco meus anseios, sem perder, porém, a esperança.

Eu sou um simples colhedor de frutas. Minha ambição de vida é encontrar a maçã perfeita. E procuro, procuro, procuro...

2 comentários:

  1. Ah, muito bom o texto. Marinho, como sempre, na moita né? UHASHUAS
    Bom, piadas a parte, gosto do jeito que vc usa metáforas para compor seus temas, e o tema dessa vez foi justamente a busca por perfeição em outra pessoa, que quase sempre acaba em fracasso.

    E é justamente sobre isso que falei no meu último post.
    http://ilusoesdeamorpuro.blogspot.com/2010/12/os-olhos.html

    ResponderExcluir
  2. NOSSA!!! simplesmente lindo...
    Ao ler o texto pensei na relatividade das coisas, o que é bonito e interessante para uma pessoa pode nao sê-lo para outra...E pensar que o mundo esta ai, cheio de modelos que a maioria da sociedade teima em seguir. Mesmo que para isso tenham que deixar de comer, para ficar como barbies, por exemplo.
    E o final do texto, noss...
    Perco meus anseios, sem perder, porém, a esperança.
    É isso que a "doce" ilusão faz com os meros mortais sofredores, mas que bom que nao perdemos a esperança e a vontade de viver.
    Afinal, a busca da "maçã perfeita" tem que continuar...
    ; )
    bj

    ResponderExcluir